Na sexta-feira (5/6), Dia Mundial do Meio Ambiente, o ministro Ricardo Salles anunciou o lançamento do que classificou de “maior programa do mundo” de pagamento por serviços ambientais, com previsão de US$ 96,5 milhões (cerca de R$ 500 milhões) para atividades de conservação e recuperação da natureza nos próximos três anos.
O projeto anunciado, porém, não é o maior do mundo. Há outras iniciativas de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) com mais recursos aplicados. A cidade de Nova York (EUA), por exemplo, iniciou em 1997 um programa para garantir o abastecimento de água potável que já resultou em investimentos de US$ 1,5 bilhão na proteção dos serviços ecossistêmicos de sua bacia hidrográfica.
Foram aportados por ano cerca de US$ 167 milhões para assegurar água de boa qualidade, conservando o meio ambiente, o que gerou economia aos cofres públicos de pelo menos US$ 4,5 bilhões em investimentos e US$ 83 milhões por ano em manutenção do sistema de tratamento de água.
Outro exemplo, também nos Estados Unidos, é o Programa Reservas de Conservação, criado em 1985 e administrado pelo Departamento de Agricultura para conservação de terras privadas do país, cujo investimento anual é de quase US$ 2 bilhões. O objetivo é restabelecer a cobertura do solo para ajudar a melhorar a qualidade da água, evitar a erosão em margens de rios e reduzir a perda de habitat para a vida selvagem. Os agricultores que participam do projeto deixam de utilizar terras ambientalmente sensíveis para a produção agrícola, mantendo espécies vegetais que melhoram a qualidade ambiental.
O programa Floresta+, lançado pelo governo federal, foi elaborado em 2018 pelo ministério do Meio Ambiente – na gestão Michel Temer (PMDB) – e submetido em agosto daquele ano ao Fundo Verde do Clima (GCF, na sigla em inglês), um dos fundos multilaterais vinculados à Organização das Nações Unidas (ONU) para financiamento de projetos que gerem benefícios ambientais globais relacionados à mudança do clima.
Foi aprovado em fevereiro de 2019 e conseguiu captar US$ 96,5 milhões. É um quinto do total disponibilizado para programas de redução de emissões por desmatamento pelo GCF para o mundo inteiro. Há mais US$ 53,5 milhões que poderão ser captados futuramente, a depender de resultados do desmatamento na Amazônia.
Agricultores familiares, povos indígenas e comunidades tradicionais da Amazônia são o público-alvo do projeto apresentado ao fundo internacional. Com o pagamento para quem conserva e recupera a vegetação, o objetivo é desestimular a derrubada da floresta.
O programa só foi aprovado porque houve redução das emissões de gases de efeito estufa do desmatamento na Amazônia nos anos de 2014 e 2015 – em relação ao nível de referência de emissões florestais apresentado à Convenção do Clima da ONU. As taxas de desmatamento nesses dois anos, durante o governo Dilma Rousseff (PT), foram 95% e 57% respectivamente menores do que a registrada em 2019, primeiro ano do governo Bolsonaro.
Esse mecanismo internacional de pagamento por resultados, conhecido como REDD+, foi criado no âmbito da Convenção do Clima e está previsto no Acordo do Paris, resultado do protagonismo do Brasil nas negociações internacionais à época.
Também é com base nos resultados de REDD+ que são aportados recursos para o Fundo Amazônia, que havia captado US$ 1,23 bilhão até ser paralisado pelo governo Bolsonaro. A proposta do Brasil foi a primeira aprovada no âmbito do Programa Piloto de Pagamentos por Resultados de REDD+ do GCF, lançado em outubro de 2017.
No Dia do Meio Ambiente, o ministro Ricardo Salles parabenizou o presidente Jair Bolsonaro pelo lançamento do programa, apesar de tanto os resultados de redução do desmatamento que viabilizaram a captação de recursos quanto a elaboração do projeto terem ocorrido em governos anteriores.
O então diretor do Departamento de Florestas e Combate ao Desmatamento e toda a equipe responsável pela elaboração do Floresta+ foram exonerados dos postos de gestão no ministério em 2019. Não há informações até o momento sobre como o projeto será implementado. O MMA foi procurado na sexta-feira (5/6), mas não havia respondido até a publicação desse texto.
Os documentos para formalização do Floresta+ junto ao GCF pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), que atua como agência implementadora, foram assinados com atraso de mais de um ano por resistência de Salles em beneficiar povos indígenas e comunidades tradicionais.
Ao mesmo tempo em que reclamava que o desmatamento acontecia por falta de oportunidade econômica para os pequenos agricultores e por não haver pagamento por serviços ambientais, o ministro travou centenas de milhões de reais que poderiam ter sido usados para isso desde março de 2019 – antes da crise das queimadas.
O Floresta+ era uma das abordagens previstas no Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm) e no Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Planaveg), que foram engavetados pelo ministério do Meio Ambiente no governo Bolsonaro.